Perda de memória não é própria do envelhecimento. Problema precisa ser investigado
À medida que a população envelhece, cresce a incidência de demências, dentre elas, a Doença de Alzheimer. Um dos desafios lançados aos profissionais de saúde é o de assegurar um diagnóstico preciso e formas de tratamento visando à qualidade de vida desta população. Diante dessa realidade, faz-se necessário realizar um diagnóstico precoce para que se obtenha maior eficácia no tratamento, destaca a psicóloga Silviane Andrade, especialista em Neuropsicologia.
Diante da dificuldade de chegar a um diagnóstico, descreva a importância do tratamento precoce e das possibilidades de melhorar a qualidade da vida do paciente. Ao falarmos em diagnóstico precoce, estamos nos reportando a uma fase anterior à instalação da demência, que é o Comprometimento Cognitivo Leve (CCL). O CCL é de difícil diagnóstico, uma vez que se confunde com o envelhecimento normal, já que os déficits são ainda muito sutis e, como no processo de envelhecimento, há um rebaixamento da memória (próprio da idade), isso mascara os sintomas do CCL. Muitas pessoas pensam que, pelo fato de estarem envelhecendo, é normal terem problemas de memória. Porém, isso não é verdadeiro, pois pode haver uma diminuição de memória, mas até determinado limite. Além desse limite, já se configura como patologia, devendo ser investigada e tratada. Para tanto, a Neuropsicologia é uma ciência nova que vem contribuir sobremaneira para esse diagnóstico.
O que é Neuropsicologia e suas áreas de atuação? É uma área da ciência relativamente recente que surgiu da confluência da neurologia com a psicologia e que tem duas vertentes: a avaliação neuropsicológica e a reabilitação neuropsicológica. Ela atua tanto no diagnóstico de doenças neurológicas (demências, parkinson, AVC, epilepsia, TDAH, distúrbios de aprendizagem, etc.) e psiquiátricas (depressão, transtorno bipolar, etc.) e no tratamento das mesmas.
No que consiste uma avaliação neuropsicológica? Trata-se de um exame feito por psicólogos especializados em Neuropsicologia, por meio do qual é feito um mapeamento cerebral, em que são avaliadas as funções cerebrais superiores do paciente, como memória, atenção, raciocínio, linguagem, percepção, ou seja, todas as funções responsáveis pela eficiência intelectual. O exame possibilita quantificar as alterações dessas funções, assim como verificar se essas alterações estão compatíveis com a idade ou se já se configuram como um déficit. Para um bom funcionamento da memória, há um envolvimento de motivação, atenção e intenção. No caso das pessoas que não possuem um humor positivo (depressivas ou ansiosas) tendem a apresentar dificuldades de memória bastante graves, não conseguindo organizar seu dia-a-dia de forma adequada. Por isso, a avaliação neuropsicológica é importante, uma vez que possibilita um diagnóstico diferencial entre problemas de memória decorrentes de depressão (quadro extremamente comum no idoso), ou se são decorrentes de demência. Realizando o diagnóstico e encontrando alteração de memória, mesmo que ainda sutil, existe a reabilitação neuropsicológica, cujo objetivo é estimular a memória e as demais funções cognitivas para que o déficit não evolua de forma intensa e rápida, e assim, possa retardar a instalação da demência. A reabilitação também atua no tratamento das pessoas que já foram diagnosticadas com demência.
Como é realizada a reabilitação neuropsicológica em pacientes com Alzheimer? É feita por uma equipe multi e interdisciplinar formada por neuropsicólogos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos etc. A reabilitação neuropsicológica consiste no atendimento psicoterápico, na estimulação cognitiva, atendimento em grupo e no apoio aos familiares.
Qual a importância de cada um deles? A psicoterapia se faz necessária quando há comorbidades, ou seja, associação da demência com depressão, pois além de trabalhar as perdas sofridas, ajuda no enfrentamento da nova realidade na vida do paciente e familiares. A estimulação cognitiva baseia-se no que as neurociências têm descoberto recentemente sobre a neuroplasticidade, que é capacidade do cérebro de se regenerar mediante seu uso e potenciação: no sentido de moldar o cérebro através da atividade. Daí propõe-se atividades que estimulem não apenas a memória, como as demais funções responsáveis pelo bom funcionamento intelectual. Pois o que acontece é que o ser humano, após aposentar-se e, à medida que avança em idade, tende a diminuir seu contexto profissional e social, fazendo com que não use e nem estimule mais seu cérebro. Uma comparação grosseira que podemos fazer é quando utilizamos um eletrodoméstico (ex: liquidificador), e passamos um ano sem usá-lo. Quando formos ativá-lo novamente, ele não funcionará mais, pois estará enferrujado. É como se acontecesse mais ou menos assim com o cérebro, quanto mais utilizamos o cérebro no nosso trabalho, em leituras, atividades intelectuais, melhor ele funciona, pois precisa de estímulos e, quando não recebe mais esses estímulos, acaba por atrofiar.
E como é realizado o atendimento em grupo e sua importância no contexto geral do tratamento? É extremamente importante, pois como o idoso tem seu contexto social reduzido, o atendimento em grupo possibilita uma ressocialização, na qual o paciente pode criar novos laços de amizade, sair para outros lugares. Costumamos levar os pacientes para visitar museus e exposições, estimulando sua criatividade e atividade expressiva, como forma de tornar o tratamento uma atividade prazerosa. Pois como diz uma de nossas pacientes que tem Alzheimer, em fase moderada, ao chegar para o atendimento em grupo: ´eu não sei o que vim fazer aqui, mas quando chego aqui, eu gosto tanto´. Resgatar esse sentimento de alegria e de que, mesmo com demência, pode-se dar qualidade de vida a esses pacientes é o nosso grande objetivo. Por fim, não há como tratar um paciente de Alzheimer e não cuidar da família. Realizamos reuniões mensais com os familiares de pacientes, momento no qual prestamos esclarecimentos sobre a doença, assim como propiciamos um espaço de desabafo dos familiares-cuidadores sobre as experiências vividas por essa doença, tão sofrida para todos.
De quais ferramentas o neuropsicólogo lança mão para realizar a estimulação cognitiva e conseguir a ativação cerebral? Numa sessão de grupo, por exemplo, iniciamos com uma fase de relaxamento, cujo objetivo é esquecer preocupações e ajudar a se concentrar nas tarefas que serão propostas. A seguir, realizamos as atividades de estimulação e, por último, explicamos como e quais as áreas que as atividades realizadas ativaram o cérebro. Portanto, a estimulação cognitiva lança mão desde o fornecimento de informações de como o cérebro funciona ao próprio paciente como, por exemplo, os fatores que interferem na memória, como estresse, preocupação, desinteresse, falta de motivação, entre outros, até a realização de atividades que promovam a estimulação das várias esferas cognitivas. Para ajudar na orientação têmporo-espacial, propomos estratégias compensatórias como agendas, cronogramas, calendários. Para a memória, podemos solicitar que resgatem informações de histórias contadas previamente, que falem sobre atividades realizadas no dia anterior ou o que tem para fazer no dia seguinte (que estaria relacionada à memória prospectiva). Para estimular linguagem, podemos dar algumas letras aleatórias e solicitar que formem o máximo de palavras com essas letras. Para a percepção, podemos pedir que o paciente procure um estímulo específico no meio de vários outros. Enfim, esses são apenas alguns exemplos dentro de uma infinidade de outras atividades que possibilitam a estimulação cerebral. Ao longo do tratamento, também incluímos atividades artísticas/expressivas que ajudam a estimular o hemisfério cerebral direito do paciente.
Qual a real necessidade de se manter o cérebro sempre em atividade? Manter o cérebro sempre ativo pode ajudar a retardar a instalação da doença, pois como a demência é uma doença degenerativa e para a qual ainda não há cura, é importante estar sempre realizando atividades intelectuais. Uma vez que as conexões entre os neurônios estejam bem consolidadas, mais tempo levará para elas se desfazerem, ou seja, mais tempo o cérebro ficará funcionante. Isso é o que chamamos de reserva intelectual, na qual as pessoas que usarem mais o cérebro terão mais proteção em relação aos sintomas demenciais. Para isso, realizamos também um trabalho com idosos que ainda não apresentam problemas demenciais, mas que já apresentam algumas queixas de memória. O objetivo principal é ativar o cérebro, protegendo-o.
Qual a idade média desse grupo ou a partir de qual idade os que possuem histórico familiar de Alzheimer ou demências devem observar mais atentamente o comportamento do cérebro/memória?
A idade considerada crítica é a partir dos 65 anos, pois é quando aumenta a incidência dos estados de demências em geral. Portanto, quem perceber nessa faixa etária o surgimento de alterações de memória ou que tiveram antecedentes de Doença Alzheimer na família, estão aptos e podem se beneficiar do trabalho de estimulação cognitiva.O importante é investigar os níveis dessa perda.
Fique por dentro
A doença pode manter-se invisível durante anos Forma mais comum de demência, a Doença de Alzheimer foi descrita pela primeira vez em 1906 pelo psiquiatra alemão Alois Alzheimer. Acomete geralmente pessoas acima de 65 anos, embora seu diagnóstico seja possível também em pessoas de outras faixas etárias. O número de portadores é crescente no mundo inteiro.
Embora existam pontos em comum, cada paciente sofre a doença de forma única. A perda de memória é o sintoma primário mais freqüente. A dificuldade maior em fechar o diagnóstico reside no fato de os primeiros sintomas serem confundidos com problemas decorrentes da idade ou de estresse.
Com o avançar da doença, aparecem novos sintomas: confusão, irritabilidade e agressividade, alterações de humor, falhas na linguagem, perda de memória a longo prazo e das funções motoras. A doença pode se desenvolver em um período indeterminado de tempo.
Fonte: Avol - www.assistiva.org.br
muito boa essa materia... me ajudou muitooo. tah de parabens
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