quinta-feira, 25 de março de 2010

Médico frio...Você quer um desses???

O cérebro humano é dotado da capacidade automática de empatia: quando é exposto ao sofrimento de outra pessoa, ou mesmo o imagina, ele se importa como se a dor alheia fosse sua. A empatia, portanto, é essa mimetização da reação do cérebro do outro. Assim, o sorriso do outro nos alegra e o seu sofrimento...dói.
Entretanto, a reação dos profissionais da área da saúde ao sofrimento alheio parece distinta da empatia que as demais pessoas experimentam, principalmente os médicos. Será esse um embotamento emocional (tipo: "não to nem aí pra vc") aprendido por prática e necessidade serve para sobreviver à própria profissão? Será que, ao contrário, só se torna médico quem consegue não sofrer junto com o paciente? Será que os médicos de fato não empatizam com seus pacientes, ou apenas não o demonstram?O fenômeno da empatia à dor se dá em duas etapas: uma inicial, automática e relacionada à afetividade, e uma posterior, de avaliação cognitiva. Estudos de neuroimagem já haviam demonstrado que, ao ver alguém ser espetado por uma agulha, o cérebro de pessoas “comuns” (leia-se não médicas) tem rapidamente ativados circuitos, como o córtex cingulado dorsal e a ínsula anterior, envolvidos no processamento afetivo da dor – como se ela fosse sua. Daí a aflição e a compreensão da dor do outro. No cérebro dos médicos, ao contrário, essas regiões não são ativadas, mas outras são, envolvidas com atenção, função executivas e autocontrole – como se o médico fizesse força para ignorar o sofrimento alheio, e acabasse conseguindo.
Mas uma outra interpretação seria possível: a própria falta de empatia poderia se tornar automática nos médicos. Um estudo publicado na revista NeuroImage desvendou o mistério. Pesquisadores do grupo de Jean Decety acompanharam a dinâmica da atividade elétrica dos cérebros de médicos e não-médicos, registrada pelo EEG (eletroencefalograma), enquanto esses assistiam a cenas de pessoas sendo espetadas por uma agulha ou tocadas por um cotonete. Descobriram que, tanto no momento inicial (apenas um décimo de segundo após o estímulo visual – relacionado ao componente afetivo) quanto em um posterior (também em menos de meio segundo – associado ao caráter cognitivo), o cérebro dos médicos se comporta da mesma forma ao assistir às situações dolorosas ou não, enquanto o dos outros reage de forma diferente a cada uma dessas situações. 

Esses resultados sugerem que a modulação negativa da empatia à dor que ocorre nos médicos se dá tanto em um nível automático quanto cognitivo. E comprovam que – sim! – os médicos são mais frios quanto à dor alheia, como vários pacientes já reclamam. Analisando bem, pode ser que é justamente essa “frieza”, essa tolerância, que permite que os médicos realizem seus trabalhos. Por exemplo, um ortopedista desesperado com uma fratura nunca conseguiria repará-la. Um pediatra que experimentasse a mesma sensação dos pais de uma criança que se machuca teria comprometida sua capacidade de ajudar, pois a empatia pode levar a um estado geral de alarme e ansiedade. Com a exposição sucessiva, seu próprio bem-estar ficaria prejudicado – e, com isso, sua habilidade médica. A “falta” de empatia do médico pode incomodar. Mas pense bem: em uma emergência, você preferiria ser atendido por um médico tranquilo que resolve o problema rapidamente ou por um médico que se desespera e chora junto com você????

Fonte: Decety J, Yang C, Cheng Y (2010) Physicians down-regulate their pain empathy response: An event-related brain potential study - www.cerebronosso.bio.br

Um comentário:

  1. Pera la . Existem milhares de pessoas que não possuem esse tipo de sentimento e que não são medico. Soldados com sangue nos olhos... fotógrafos de tragedias, fofoqueiros de catástrofes. isso para falar de profissões ou de atividades legais. nao tem a poesia do machado de assim -sera que eh delicioso ver padecer...
    Talvez os medicos apenas se disponham com maior facilidade a tais estudos, e isso pode enviezar todo o conteudo.
    Os medicos as vezes convertem coisas ruins em coisas boas...

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